segunda-feira, 1 de maio de 2017

Leituras - Gente Independente

 “(…) estou de acordo com o nosso rei das montanhas em que se olharmos para os ideais das guerras com um olho e para todos aqueles homens e mulheres que são destituídos de vida e de saúde com o outro, então não é de admirar que às vezes nos visite o pensamento de que porventura seria melhor que os homens se esforçassem mais por poupar vidas humanas em lugar de ideais. Porque se os ideais não visam fomentar a vida humana aqui na Terra, mas matar homens aos milhares, ora então podemos perguntar-nos se neste caso não seria mais plausível ficarmos completamente destituídos de ideais, embora uma vida assim fosse naturalmente vazia. Porquê, se os ideais não são a vida e a vida não são os ideais? Logo, o que são os ideais? E o que é a vida?

O Independent considera-o o livro do século e mesmo sabendo que as generalizações são muito redutoras e feitas por vezes de apreciações  precipitadas, neste caso é uma classificação que se compreende pela dimensão da escrita que encontramos, no livro de Halldór Laxness, Gente Independente. O livro publicado em 1935 e que permitiu a Lalldór Laxness o Nobel da Literatura em 1955 é uma epopeia que embora partindo de uma situação particular, a Islândia do início do século XX e a sua história torna-se uma narrativa universal por aquilo que envolve a sua construção.
Gente Independente tem em Bjartur uma criação fantástica que o coloca ao lado de um leque de personagens essenciais da Literatura. Bjartur tem um sonho, ser um homem independente, pois para ele, o maior desejo do homem é a sua liberdade. A liberdade carece de independência e assim a sua maior conquista na vida é construir essa independência. Ao lado de Bjartur existem um conjunto de personagens que nos dão um retrato da Islândia e uma forma de vida muito particular.

Gente Independente é uma composição humana à procura de um sentido humano da independência numa terra de condições geográficas muito difíceis, mas também de conquista de um modo de felicidade na terra dos homens. As análises da vida social são integradas num esforço humano de superação e numa descrição de paisagens naturais de grande beleza, de grande afirmação do mundo natural.
Gente Independente é um livro monumental, pela dimensão,  pela temática, pela interrogação ao mundo social, pela dureza de muitas das opções feitas, das vidas vividas, mas é também um livro especialmente terno. Gente Independente consegue ser comovente na história de um homem, de uma natureza irónica fascinante, uma pronunciação de verdadeira liberdade, o pensamento criador de uma acção, mas também revoltante por aquilo que nos faz viver.

A leitura do livro não é fácil pois a dimensão dos parágrafos e as tensões propostas na luta das personagens implicam muito esforço. É um grande livro que nos faz emergir numa atmosfera que em muitas circunstâncias queremos pertencer, sobretudo estar junto de Bjartur e da sua luta estóica, indómita pela conquista de um ideal a que tenta juntar um sentido de compaixão e de amor pela família. 

A luta de Bjartur é a tentativa de construir uma vida livre e digna. O final do livro acaba por ser uma decepção, pois após a conquista da sua independência, a formulação de algum conforto retira-lhe a liberdade. Fica a esperança sempre a reconstruir as perdas e o que sobra dela. Um livro mágico e de uma beleza estonteante, no sentido mais puro que a Literatura pode ser. Gente Independente acaba por ser uma metáfora real sobre a Islândia, o gelo e o fogo. E nesse sentido Bjartur é a sua melhor forma de a compreender, o homem e a natureza, o social e a liberdade.

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