segunda-feira, 22 de junho de 2015

Leituras - Tudo o que conta

“A ficção está acima da verdade. Num outro patamar moral e estético, artístico. A verdade na memória remete para uma verdade mais objectiva, algo que terá acontecido. Terá ele visto? Terá ele dito? Terei sentido? Será que fomos? Eu adoro a memória. A nossa vida acaba por ser só memória. Está sempre a ir embora a todo o tempo, a mudar.”

James Salter é um desconhecido entre nós. Há escritores assim que estão um pouco acima de modas, descobertas, campanhas de divulgação. James Salter é amplamente conhecido em diferentes países, mas sobretudo nos Estados Unidos da América. É um artesão de palavras, um decifrador do que em cada momento pode ser uma memória, um gesto de pequena eternidade que prolonga esta respiração carente e celestial para algo mais largo, mais permanente. Tudo o que conta é o primeiro livro de James Salter publicado em Portugal e foi o seu último livro. Tudo o que conta seria uma história quase banal se o seu autor não fosse um grande escritor. É a história de muitos cidadãos da América que durante a 2ª guerra mundial eram jovens, nela combateram e depois dela construíram uma vida. Piloto de aviões no Pacífico James Salter conta-nos essa vida à procura de qualquer coisa de essencial rumando contra o tempo.

Tudo o que conta é um romance sobre o tempo presente, e onde se juntam um jogo literário que concilia a informação real na ficção e na memória, como ela pôde ser construída. A procura de uma verdade na memória, a procura de um sentido biográfico da sua vida, do piloto de aviões, do editor literário, dos insucessos na vida sempre à conquista de qualquer valor de permanência. Na verdade a vida que temos é apenas um discurso vivido da memória, pois a vida  como Salter dizia "está sempre a ir embora".  

Muitas vezes a nossa vida é só um sonho, e o que fizemos ou sentimos ou amamos tornou-se uma sombra onírica. Philip Bowman, o alter-ego de Salter vive neste livro esta história de Pearl Harbour, desse herói e das dificuldades de numa sociedade sem guerra construir alguma perenidade. As memórias construíram esse registo do que poderia ter sido a vida desse rapaz, dessa geração, e o registo do que foi uma vida, os caminhos respirados de uma existência. O livro busca ainda essa decifração do que foi o significado de Pearl Harbour na América. E procura-o buscando a pedra essencial tentando ouvir o som das palavras, o seu cheiro na vida das pessoas, o seu registo na memória, a única alma viva de de uma vida.

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