sábado, 22 de agosto de 2015

Eleições Legislativas - 2015 (5) - Ler para compreender (IV)

A ideologia de empresa neoliberal constrói com o silêncio e a auto-exploração novas formas de capitalismo, diferentes mecanismos de coação sobre as pessoas, sobre a liberdade, sobre o fundamento mais antropológico do ser humano. A ideologia neoliberal transforma cada um, quando incapaz de metas estabelecidas no ser desprezível, responsável pelo fracasso de um sistema que se fundamenta a si próprio pelo lucro, a maximização do poder dominado nas empresas e relacionado com os agentes políticos. É o domínio do biopoder que Deleuze e Foucault afloraram, mas que tomou dimensões ainda mais trágicas para a decência e para uma civilização que ainda se possa dizer humana. 

Nesta dominação psicológica de biopoder recursos nacionais têm sido destruídos para a construção de um domínio ideológico centrado em empresas que se comportam sem valores éticos, os psicopatas para quem não existe comunidade, apenas negócios. Estes centrados numa estratégia essencial de privatizar tudo, revelam todo um corpo de cedência de interesses a grupos monopolistas e em prejuízos para o Estado que devem ser onerados pelos cidadãos. A cartilha é conhecida. É importante ter os dados e saber os autores dessa estratégia suicida para o País, como comunidade de pessoas. Mariana Mortágua e Jorge Costa dão-nos um livro que desmonta esse processo feiro no País desde os finais do século XX, justamente Privataria.

Os programas de privatização buscavam os seguintes objectivos:
  • promover o reforço de competitividade da economia portuguesa;
  • dinamizar o mercado de capitais;
  • reestruturar e reforçar os sectores produtivos da economia nacional;
  • melhorar a situação financeira de empresas incluídas no sector público;
  • contribuir para a redução da dívida pública;
  • diminuir o peso do Estado na captação de recursos financeiros;
  • defender os interesses patrimoniais do Estado. (p. 156)  
Qualquer cidadão informado e que tenha por aqui vivido nas últimas três décadas conhece o que tem sido a transparência das políticas seguidas por PS, PSD / CDS que é basicamente a mesma, a da destruição de um património que poderia garantir formas e recursos de desenvolvimento sustentado. A classe política saída do golpe militar do 25 de Abril não tem ideias próprias, segue em décadas de atraso o que vê lá fora. There is no alternative é pois caminho de uma esquerda sem esquerda, à direita da avidez antiga. Privataria apresenta-nos os dados e os nomes. Os privilégios da banca e os monopólios favorecidos, a GALP, a CIMPOR, a EDP, a PT, a ANA, o BPN, os CTT e a TAP, e os sagrados nomes dos iluminados, nas ligações que do PS ao CDS corporizaram um saque ao País.

Privataria demonstra o que sabíamos. Elas foram a estratégia para criar um regime económico de favorecimento a poucos grupos económicos que consolidaram o seu poder e alimentaram relações de promiscuidade com os agentes políticos. O actual Presidente da República, o seu partido, o excelso gestor Ferreira do Amaral, mas também o PS com a inefável coerência de Jorge Coelho, ou a Mota Engil ou a estratégia universal de competência do Srº Bava e dos agentes no governo, os CEO do milénio tudo se comprova. A lista é só estrelas dos media e da comunicação cor-de-rosa em que o país é fértil. Somos pobres porque somos desgovernados por interesses mesquinhos.

Privataria revela o que foi a privatização em quarenta anos de regime pós- Estado Novo. Um crime contra o país, praticado consciente e reiteradamente (p. 156). A opção de destruir as capacidades produtivas iniciadas pelo deslumbrante srº economista,  a destruição do sector público, o endividamento para o estado e as rendas para os protegidos accionistas levou a uma dívida pública de níveis nunca atingidos ao longo de todo o século (p. 156). É o brilhantismo do neoliberalismo ou a desastrada incompetência de uma terceira via que o engenheiro Sócrates alimentou em vaidades sem nexo. 

Na verdade nenhuma privatização melhorou o desempenho da empresa que foi vendida, porque e essa é outra mentira dos neoliberais. Em igualdade de funcionamento os privados fazem sempre pior. A privatização é um crime contra o País porque altera substancialmente o modo como os preços são definidos, como os serviços são prestados e rompe com os interesses / direitos públicos. Porque em muitos casos tratam-se direitos de comunidades, sim quer falemos de comboios, de saúde ou de serviços de correios. 

A privatização fez aumentar as desigualdades entre as pessoas, destruiu formas evidentes de coesão nacional e alterou negativamente a própria identidade do território. O neoliberalismo, receita do PSD / CDS para o País e aceite em formatos de incerteza e pouca convição pelo PS conduzem a uma sociedade  que Byung-Chul Han designou Psicopolítica, ou  seja a construção de territórios onde as pessoas sujeitas a um domínio de informação praticam comportamentos condicionados em níveis subconscientes por um poder totalitário, embora pareça formalmente livre. O neoliberalismo é incompatível com uma ideia de liberdade, onde existem pessoas que não são sujeitos, mas "apenas uma existência floral: simples abertura à luz". (1)

(1) B Strauss, Litcher des Toren. Der Idiot und seine Zeit, p. 175, citado de Byung- Chul Han. (2015). Psicolopoítica. Relógio DÁgua, p. 156. 

1 comentário:

  1. UMA PRIVATIZAÇÃO ESTÁ PARA O PAÍS, COMO A AMPUTAÇÃO DE QUALQUER ORGÃO ESTÁ PARA O SER HUMANO

    ResponderEliminar