quarta-feira, 23 de abril de 2014

William Shakespeare

 "O bobo e o rei na chuva mostram  que todos os homens são iguais e sofrem, cada qual a seu modo da sua fragilidade. O rei agora pobre e nu , ao relento descobre sua verdadeira identidade, mortal e frágil como qualquer de seus súditos: “ Quem pode vir me contar quem em verdade eu seja?” (1)

William Shakespeare nasceu  a vinte e três de Abril de 1564 em Stratford-up-Avon e morreu no mesmo dia no ano de 1616. É um nome imortal da literatura, o maior de língua inglesa e sem dúvida o maior dramaturgo de sempre pelo conjunto de uma obra que oscilou entre a poesia, os poemas narrativos e o teatro. Não se conhecem muitos aspectos da sua vida, havendo alguns dados conhecidos sobre onde estudou e a sua vida familiar.

Terá sido entre 1585 e 1592 que o seu nome começa a ser falado em Londres, onde fara sucesso numa companhia de teatro, Lord Chamberlain´s Men, de que será proprietário . As primeiras obras de Shakespeare são sobretudo comédias e obras com base em personagens históricas. Serão as suas tragédias que lhe darão um lugar na posteridade, como Rei Lear, Hamlet ou Macbeth. 

Shakespeare soube imortalizar no placo da vida, neste vale de tantas dificuldades a que nos foi dado viver o pensamento sobre as questões mais eternas, que desde os Gregos se colocarão, a honra, a morte, a lealdade, a injustiça, a ganância do poder, a beleza e o amor. A eles e à sua forma expressiva de escrever teatro conseguiu essa imortalidade a que se junta uma data significativa - O Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor.

(1) (via  http://www.recantodasletras.com.br/resenhasdeteatro/1931346)

Dia Mundial do Livro

"- A sua hipótese é possível, mas não é interessante, respondeu Lonurot.
- Responder-me-á que a realidade não tem a menor obrigação de ser interessante. 
Ao que eu responderei que a realidade pode ignorar essa obrigação, mas as hipóteses não."

Jorge Luís Borges, "A morte e a bússola", 
in Alberto Maguel, Do outro lado do Bosque

terça-feira, 22 de abril de 2014

Dia da Terra - ouvir "os selvagens"

(É um texto muito conhecido e divulgado e faz eco de uma sabedoria selvagem, a que nós civilizados não conhecemos. Há já vários séculos houve quem soube compreender que a Terra é um berço de vida, onde é necessário respeitar a memória e o património, sinónimos de um desenvolvimento humano equilibrado. Aqui fica um excerto dessa sabedoria que nós, modernos, não sabemos entender.)

«É possível comprar ou vender o céu e o calor da terra? Tal ideia é estranha para nós. Se não possuímos a frescura do ar e o brilho da água, como podem comprá-los? Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada areia da praia, cada bruma nas densas florestas, cada clareira e cada insecto a zumbir são sagrados na memória do meu povo. (...)
 
Deste modo, quando o Grande Chefe manda dizer que quer comprar a nossa terra, ele pede muito de nós. (...) Assim, consideraremos sua oferta de comprar a nossa terra. Mas não será fácil, pois esta terra é sagrada para nós. Esta água brilhante, que corre nos riachos e rios, não é somente água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada e devem ensinar às vossas crianças que ela é sagrada, e que cada reflexo do espírito, na cristalina água dos lagos, revela acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz dos meus ancestrais.
 
Os rios são nossos irmãos, eles saciam a nossa sede. Os rios transportam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos a nossa terra, vocês devem lembrar-se e ensinar às vossas crianças que os rios são nossos irmãos, e vossos também, e que devem, daqui em diante, dar aos rios a bondade que dariam a qualquer irmão. (...) A terra [para o homem braco] não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando ele a conquista, continua simplesmente seu caminho. Deixa para trás os túmulos de seus pais. E não se importa. Rouba a terra de seus filhos. E não se importa. As sepulturas de seus pais e os direitos de seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, sua terra, seu irmão, como coisas para serem compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou contas coloridas. Seu apetite devorará a terra e deixará somente um deserto.
 
Não há lugar calmo nas cidades do homem branco. Nenhum lugar para escutar o desabrochar das folhas na primavera ou o bater das asas de um insecto. Mas talvez seja porque sou um selvagem e não compreenda. O ruído parece apenas insultar os ouvidos. E o que resta da vida, se o homem não pode escutar o choro solitário de um pássaro? (...) Onde está o arvoredo? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. (...) É o fim da vida e o começo de uma sub-vida. (...) 
 
Guardem, na memória das suas almas, como era esta terra quando vocês se apossaram dela. E com todas as vossas forças, com todas as vossas almas, com todos os vossos corações, preservem esta terra para as vossas crianças, e a amem como Deus ama a todos, uma coisa nós sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é preciosa para ele. Mesmo o homem branco não pode estar isento do destino comum. Apesar de tudo, podemos ser irmãos. Veremos.»
 
 
Excerto do Chefe Seattle (1885), in Por Fim Talvez Sejamos Irmaõs
  Imagem, Alessandra Fuis, La Terra, Casa,in, http://alessandrafusi.carbonmade.com/

Celebrar a nossa casa - O Planeta Terra


Para reconhecermos a sua beleza e o seu valor como património essencial à vida e à humanidade, o Dia da Terra é um alerta para a ignorância de que somos feitos, de um pensamento com pouca emoção, com pouca sensibilidade para o que nos rodeia.

Imagens, Imagens, in  http://www.nasa.org

O Dia da Terra 2014

"A civilização em que estamos é tão errada que
Nela o pensamento se desligou da mão
Ulisses rei de Ítaca carpeinteirou seu barco
E gabava-se também de saber conduzir
Num campo a direito o sulco do arado." (1)

O homem possuidor de um enorme bom senso e de uma inteligência cósmica aglutina-se na cidade pelo seu conforto secular, pela alegria de em comunhão com os seus vizinhos formular caminhos de civilização onde o natural e a memória são elementos de uma espiritualidade reconfortante. Este sonho capaz de redimir o Homem e dar significado à sua existência foi abandonado pelo superior valor de adormecer na luz das cidades perdidas com as moedas que guardam o futuro de todos os possíveis.
No dia vinte e dois de Abril celebra-se o Dia da Terra. A acção destruidora do homem sobre os habitats naturais é demasiado evidente. E até os santuários naturais, locais de reserva da vida natural estão ameaçados. Costumamos por postura de consciência adquirida expor neste dia todas as consequências da acção do homem e o conjunto de intenções, sempre grandiosas que os estados nacionais e os governos irão a partir de cada momento concretizar. Os governos e os homens prestam mais cuidado às moedas com que adormecem.

É pois um dia para despertar os que ainda não compreenderam a sacralidade da natureza, a nossa de pendência dos seus fluxos vitais, o seu arquivo das nossas memórias para uma organização social com sentido. Na medida em que ao Homem ainda não parece suficiente toda a destruição causada, com consequências sobre a qualidade de vida de milhões da espécie humana, olhemos para a Terra, a sua beleza indescritível e aquilo que futuras gerações poderão perder, um Planeta grandioso e fascinante. E o convite a que saibamos estabelecer nvos padrões para a manutenção da qualidade da água e do ar e para a  sobrevivência de muitos milhões de pessoas que vivem as dificuldades de uma utilização desajustada e irracional do Planeta. 


Sophia, "O rei de Ítaca", in O nome das coisas, página 42.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Memória de Charlotte Brontë

"Do you think, because I am poor, obscure, plain, and little, I am souless and heartless? You thing wrong! I have as much soul as you, and full as much heart!" (pág. 152)

Jane Eyre é um dos livros da literatura clássica que nos dá a atmosfera das relações sociais e humanas da Inglaterra do século XIX.  Charlotte Brontë tornou-se uma das escritoras mais conhecidas de oitocentos, e Jane Eyre é grande medida uma autobiografia do que foi a sua curta vida, mas também do que eram as possibilidades das crianças nascidas em ambientes de dificuldades económicas e da própria perspectiva da participação da mulher na sociedade e na arte.

Charlotte Brontë nasceu  a vinte  e um de Abril de mil oitocentos e dezasseis no Yorkshire, em Inglaterra. Filha de um pastor irlandês, viveu a infância num presbitério isolado e pobre. Após dificuldades e insucessos vários, Charlotte, Anne  e Emily viram na escrita uma possibilidade de sobrevivência. Foi com o pseudónimo masculino de Currer Bell que Charlotte Brontë escreveu Jane Eyre, onde os traços biográficos entre ela e a personagem de ficção é muito evidente. Em ambas conhecemos os maus tratos, a difícil infância, a frequência de um colégio interno e a tentativa de ensaiar pela coragem, pela observação do quotidiano um caminho de esperança, de mudança.

Jane Eyre, publicado em 1847 é um livro onde as figuras femininas se encontram num conflito entre as suas características sociais e os seus desejos, tendo deixado além de Jane Eyre dois outros títulos,  Villete de 1855 e O professor de 1857. Na sua escrita vemos a fusão entre o romance e o realismo, trazendo para a literatura o papel e a possibilidade de a mulher por si construir um papel no mundo e a ideia de uma coerência moral como força para manter uma dignidade do espírito humano. Dá-nos a ideia de construir uma vida independente sem o obrigatório casamento e retrata-nos as condições dos orfanatos.

Jane Eyre tem em si os elementos do que seriam as ideias de emancipação das mulheres, mas também o romance moderno capaz de analisar o valor individual de cada pessoa, nessa ideia da consciência como elemento de decisão humano. Encontramos aliás em Jane Eyre um conjunto de ideias que ainda são de grande relevância, tais como:
  •  Ultrapassar as dificuldades do passado:
    “Life appears to me too short to be spent in nursing animosity or registering wrongs.”
  • A capacidade de cada um decidir a sua vida - Jane Eyre enfrenta a adversidade e acredita em si para ultrapassar as dificuldades, mesmo sem dinheiro e sem família, está sempre a perseguir o sonho de encontrar alguma felicidade.
  •  A ideia de cada um expressar o que sente:“'...it is madness in all women to let a secret love kindle within them, which, if unreturned and unknown, must devour the life that feeds it; and, if discovered and responded to, must lead, ignis-fatuus-like, into miry wilds whence there is no extrication".
  • A ideia de ser positivo de acreditar nas possibilidades de cada um - “Even for me life had its gleams of sunshine.” 
  • A capacidade de revelar resistência às dificuldades -“Yet it would be your duty to bear it, if you could not avoid it: it is weak and silly to say you cannot bear what it is your fate to be required to bear.” 
  • A ideia da vida como uma construção de possibilidades, onde os riscos podem ser oportunidades - “I remembered that the real world was wide, and that a varied field of hopes and fears, of sensations and excitements, awaited those who had the courage to go forth into its expanse, to seek real knowledge of life amidst its perils.”
  • A ideia essencial de assumirmos livremente as nossas ideias e de as defendermos com energia e o mais importante, sendo uma história de um romance, ter no amor o elemento essencial no encontro entre duas pessoas - "...I do not want a stranger--unsympathizing, alien, different from me; I want my kindred: those with whom I have full fellow-feeling."
 Jane Eyre é um imenso livro, que de uma atmosfera do século XIX tem muito para oferecer a quem o ler. A quem o seu universo interessar, do Huffingpost e um livro.

sábado, 19 de abril de 2014

O gueto de Varsóvia - a coragem

"Shuddering I shall cry:
what for and why
did my people die?"

 (Itzhak Katzenelson- I Had a Dream) - (1)

É uma história amarga, a maior delas. É uma narrativa impossível de explicar, pois não há nela nenhuma racionalidade, apenas a emoção que uma selvajaria animal ainda se faz transportar dentro de algo humano, uma humanidade clonada de formas sem espírito. Passou-se ao som de criações elevadas da capacidade de sublimar a vida, a música, a arte e a literatura. 

É uma história mil vezes repetida, mas nunca a percebemos verdadeiramente, nunca soubemos explicar porque a morte de milhões de pessoas pode ser uma alegria, uma sinfonia de vontades vitoriosas e na verdade nunca aprendemos do pouco que vemos, pois residem entre nós, nas coloridas televisões, nas radios de risos de plástico a construção por tózés do pensamento dizendo-nos que a memória é uma ocupação de falhados, não suporta o utiliatarismo que os novos iluminados habitam no conforto dos gadgets sem ideal humano.

Mas façamos um esforço, reconheçamos a esta meia dúzia de sonhadores o seu grito e o seu exemplo. O da palavra contra a violência, a explicação, o olhar que procura conhecer, o do testemunho para que se saiba se conheça, pela poesia, pela crónica, pelas imagens, pelas narrativas. E o seu grito final o de quem compreendeu que o impossível por ser humanamente inconcebível pode ser uma opção dos que vivem com os olhos na morte.

Após dois mil anos de sujeição, de incompreensão, alguns judeus perceberam que apenas lutando poderiam gritar o que sentiam, e tentar, apenas tentar mudar a sorte talhada nos campos de extermínio a que uma sociedade alemã, promessa de um desenvolvimento económico decidia encolher os ombros. Não dizia Heiddeger, o filósofo da emanência do ser que "as mãos de Hitler eram de uma beleza insuperável"?
 
Lembremos pois esses poucos, que nos mostraram no gueto de Varsóvia que a luta é a melhor forma de defender o que somos, e que embora divididos como o estavam em grupos e movimentos souberam lutar, heroicamente,na Passover, por uma dignidade contra os que apenas os queriam aniquilar. 

Fazem hoje setenta e um anos sobre esse levantamento no gueto de Varsóvia e essa luta de grandeza pela dignidade humana. É possível conhecer esta luta e o que foi a vida no gueto de Varsóvia, naquilo que foi o trabalho desenvolvido pelo historiador Emmanuel Ringelblum e que permitirira mais tarde criar o Holocaust Research Project. Pela sua vertente pedagógica e informativa, também de grande relevo o United States Holocaust  Memorial Museum.